quinta-feira, 30 de outubro de 2008

O show da mídia

Sem mais janela para espiar depois do desfecho desastrado do famigerado seqüestro de Santo André, a imprensa agora se lança na caça aos culpados. O candidato mais cotado no momento é a polícia de São Paulo. Questionam a sua competência, seus métodos, suas ações (ou a falta delas). Porém esse escrutínio todo deixou de lado uma das figuras chave do circo todo: a própria imprensa.

O caso Santo André se tornou problema de todos nós através de uma cobertura que tinha pouco de jornalística e muito de reality show. As câmeras indiscretas das principais redes de TV do Brasil invadiram o cárcere privado de modo que todos nós também pudéssemos “dar uma espiadinha”.

Há que se questionar até que ponto essa intromissão da imprensa é legítima. O artigo 7º, inciso IV, do
Código de Ética dos Jornalistas diz o seguinte:

“O jornalista não pode:

IV – expor pessoas ameaçadas, exploradas ou sob risco de vida, sendo vedada a sua identificação, mesmo que parcial, pela voz, traços físicos, indicações de locais de trabalho ou residência ou quaisquer outros sinais”.

A esta altura, depois do circo de mau gosto que foi o caso Isabella Nardoni, a audiência parece estar um pouco mais vigilante quanto aos abusos da mídia. Na blogosfera e em comunidades na web, as pessoas estão começando a se perguntar se o que a imprensa está prestando é serviço ou desserviço.

O
Observatório da imprensa, espaço tradicional de esculhambação da mídia, não perdeu tempo e dedicou toda uma sessão do seu Jornal de Debates para execrar a ação da imprensa, principalmente as emissoras de TV.

A baixaria em si ficou por conta do Orkut, que nos deu acesso aos perfis de Eloá (já apagado), Nayara e Lindemberg. Comunidades de luto e de ódio foram criadas por pessoas que, com a sensação de proximidade forjada pela cobertura televisiva, já se sentiam amigos virtuais dos envolvidos no caso.

A tecnologia permitiu até níveis mais exacerbados de mau gosto. É o caso desse
joguinho em flash que permite aos expectadores fazerem vingança com as próprias mãos e metralharem Lindemberg.

Quanto à grande imprensa, é recomendável que dirigentes da Globo, da Record e da Rede TV! dêem uma revisada básica nesse Código de Ética - que não é nem muito longo – antes de se meterem a negociar com seqüestradores desequilibrados. Até José Luiz Datena concorda. O apresentador e polemista criticou no ar em seu programa Brasil Urgente as emissoras que transmitiram entrevistas feitas por telefone com o seqüestrador. Em entrevista ao Terra Magazine ele reforça sua opinião de que a mídia teve um papel importante no desfecho trágico do seqüestro.

Ora, as coisas devem estar bem erradas em uma situação em que o Datena é a figura com bom senso.

 Anna Lisbôa - Caso Santo André

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